Outra eleição se aproxima e a questão na mente de todos é a seguinte: os grandes doadores terão o retorno esperado?
O cinismo sobre o financiamento de campanhas é uma resposta saudável a nossa longa história de capitalismo de compadrio. Quando os US$ 700 bilhões do pacote de resgate foram distribuídos durante a crise de 2008, instituições financeiras conectadas politicamente tais como Goldman Sachs receberam a maior parte. Nos anos 1990, a notória Enron estrategicamente fez doações significativas aos Democratas e aos Republicanos para assegurar que, independente do resultaria, ela teria um lugar à mesa. Fora do setor privado com fins lucrativos, sindicatos são também grandes doadores, assim como ativistas ambientalistas ricos e ONGs, além de outros interesses especiais. Como diz o velho ditado: quem paga o flautista dita o tom e, por consequência, os instrumentos e os músicos.
Depois de um pouco de cinismo, todavia, quais deveriam ser nossos próximos passos?
Uma reação comum é pedir mais controles durante o processo eleitoral. Algumas pessoas sugerem que deveríamos aprovar regulamentações mais rígidas que limitam as doações às campanhas eleitorais, além de conceder mais poderes aos agentes governamentais para que monitorem como as pessoas gastam seu dinheiro na política.
Porém, clamores por mais controles em uma democracia livre deveriam sempre ser um sinal de alerta, e antes de analisa-los, deveríamos considerar duas questões: quanto nós deveríamos nos preocupar com os gastos eleitorais? E a tentativa de controle do dinheiro nos levaria à fonte da corrupção do poder político?
As questões são atuais, como a Suprema Corte recentemente declarou inconstitucionais os limites impostos ao quanto os indivíduos podem doar a comitês ou candidatos políticos. Em McCutcheon v. Federal Election Commission, o tribunal decidiu — de forma apropriada, a meu ver — que as provisões de liberdade de expressão da Primeira Emenda eram violadas pelas restrições da FEC (tradução livre, Comissão Eleitoral Federal). Limitar a quantia de dinheiro que um indivíduo pode gastar é limitar quantos panfletos, pôsteres, e outras formas de publicidade ele pode adquirir, e como consequência, sua capacidade de expressão. Em uma sociedade livre, os indivíduos podem aplicar seu dinheiro no que acreditam, isto é, promover qualquer causa que desejarem — comercial, religiosa, artística ou política.
Certo. Mas e o que dizer da preocupação sensata de que os grandes doadores serão capazes de fazer muita propaganda e, por meio disso, ganhar a eleição?
Por diversas razões, acredito que não há nenhum problema.
Uma delas é o princípio da física política: para todo Koch existe um igual e oposto Soros. Isto é, para todo o bilionário que doa fortunas a um partido, existe quase sempre outro que faz o mesmo para o partido rival. Nenhuma evidência histórica prova que as contribuições de Democratas e/ou Republicados ricos sejam tão diferentes em termos monetários. E quando um partido se sai melhor em uma eleição, isso sempre impulsiona os captadores de recursos do outro lado a melhorarem seus resultados na próxima oportunidade. É assim que a competição funciona.
Outra razão é que, embora o dinheiro seja um recurso importante em uma campanha eleitoral, não é a único recurso ou mesmo o mais importante. Ter um grande número de voluntários é importante. Da mesma forma, podemos citar como fundamentais: (1) as reputações anteriores dos candidatos e os grandes atletas e estrelas de TV que os apoiam, (2) a criatividade dos marqueteiros que criam novos slogans e gráficos atraentes, (3) a capacidade organizacional dos administradores de campanha e, por fim, (4) a amizade dos grandes meios de comunicação.
Se quisermos limitar e controlar as doações porque podem afetar o resultado das eleições, então, em princípio, podemos limitar qualquer coisa que possa afetar o resultado das eleições. O FEC deveria ser capaz de nos dizer quanto tempo livre poderíamos voluntariar? Ou quantas pessoas famosas podemos usar como porta-vozes de nossa causa? Ou quantos gráficos ou slogans atraentes são permitidos em cada campanha?
Uma terceira razão é que os dados mostram que os candidatos que gastam mais nem sempre ganham.
- Nas primárias do Partido Republicano na Virginia, Eric Cantor angariou US$ 5,4 milhões enquanto que seu adversário, David Brat, somente US$ 207 mil. O dinheiro de Cantor pagou por 1037 anúncios na TV, enquanto que o de Brat, 65. O resultado? Brat obteve 55.6% dos votos e derrotou Cantor e os seus 44.4%
- Nas primárias para governador do Partido Democrata no estado do Havaí, o governador Neil Abercrombie gastou mais que o desafiante David Ige em uma margem de 10:1. Grande parte do financiamento de Abercrombie veio do bilionário Lawrence Ellison. Adivinhe quem ganhou? Como publicando no The Washington Post, Abercrombie foi “derrotado de maneira esmagadora”.
- No mês decisivo, anterior à eleição presidencial de 2012, os gastos pró-Romney eram significativamente maiores que os pró-Obama, mas Obama venceu com uma margem confortável.
Claramente, existem outros fatores — e talvez deveríamos dar mais crédito aos eleitores do que considera-los meramente como marionetes que são manipulados por grandes fortunas e os grandes meios de comunicação.
O que nos leva a uma quarta e mais importante razão.
Se quisermos ser defensores da democracia em uma sociedade livre, então temos que pensar na democracia como um experimento em evolução, tanto no aspecto político quanto no de educação do eleitor. Parte da democracia é um processo em andamento de ensino às pessoas sobre como viver em uma democracia — incluindo como pensar criticamente sobre as propagandas políticas, já que são confusas. E esse processo de educação é longo, lento, confuso e passa por diversas gerações de eleitores.
Os eleitores são capazes de pensar de forma independente. É claro, muitos escolhem permanecer ignorantes, outros se agarram ferrenhamente à sua posição atual, e outros ainda iludem-se com promessas vazias. Contudo, uma política democrática não pode tomar como seu pressuposto operativo que não se pode confiar na capacidade de os eleitores votarem corretamente. Ela não pode mimá-los com medidas paternalistas para manipular o número e o tipo de mensagens políticas que ouvem e veem.
Existe um dilema no argumento contra o financiamento de ricos às campanhas: se você acha que os eleitores realmente são, na maioria das vezes, vítimas do efeito-manada gerado pelas campanhas que mais investem em propagandas, então você não deveria ser um defensor da democracia. Isto é, se você acha que eles não podem lidar com propagandas, então você não pode achar que deveriam ser ouvidos para quaisquer questões políticas importantes. Mas se você acredita que os eleitores podem pensar por si mesmos, então você não deveria se preocupar com a exposição à propaganda política, seja ela de esquerda ou de direita.
Uma sociedade livre deve tratar seus membros como adultos responsáveis — inclusive tratando-os como totalmente responsáveis por suas visões políticas e comportamento eleitoral. Qualquer democracia saudável deve estabelecer o padrão mais elevado a ser seguido pelos eleitores, e os defensores da democracia devem ensinar e, de outra forma, ajuda-los a alcançar esse nível.
A pergunta dessa coluna era: O dinheiro compra as eleições? Essa pergunta não deve ser confundida com uma pergunta relacionada: O dinheiro compra os políticos? Nós podemos ser prudentemente otimistas sobre os eleitores. Contudo, infelizmente o número grande de políticos à venda é um problema mais complexo, que merece sua própria coluna.
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“O dinheiro compra as eleições? Quando os bilionários cortejam os eleitores” Por Stephen Hicks. Tradução de Matheus Pacini. Revisão de Russ Silva. Artigo Original no “The Good Life”. Visite EveryJoe.com para ler os últimos artigos de Stephen Hicks.
Stephen Hicks é o autor do livro Explicando o Pós Modernismo e Nietzsche and the Nazis.